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Sobre tragédias e políticos sem colhões

Definitivamente, não sou um bom telespectador para matérias emocionais que contam sobre momentos de tragédia causados pelas chuvas. A mim, feliz ou infelizmente, não impressionam momentos de heroísmo ou a imagem de dezenas de corpos sendo retirado de algum dos muquifos cobertos pela terra que desce das encostas. Explico.

Essas não são tragédias. Embora disparadas por acontecimentos naturais, são planamente evitáveis. Não são como tsumanis, terremotos incêndios, que acontecem, muita vez, de forma inesperada.

Por mais que entenda o drama humano envolvido em tais situações, como diria Nelson Rodrigues, trata-se da crônica de uma tragédia anunciada. Vem cá, qualquer idiota, por mais idiota que seja, sabe que, se chover, há deslizamento no morro. Qualquer idiota sabe também que, se tiver a brilhante idéia de construir uma casa em um desses morros, existe a chance concreta (perdão pelo trocadalho do carrilho) tudo vir abaixo em um segundo de fúria das chuvas.

Oras, a equação está feita. Pra que, então, construir em área de risco?

Não venham dizer que é a falta de opção, que muitos não têm outra possibilidade, que é o único lugar disponível, etc etc etc. Isso ameniza, mas não justifica. A idéia de ocupar uma área que tem alta chance de desmoronar continua sendo tremendamente idiota, ainda que não exista outro lugar para construir.

A verdade é que, nesse jogo macabro, os moradores têm tanta culpa quanto as autoridades, que permitem as construções irregulares. Sim, porque, pra mim, permitir é praticamente o mesmo que não retirar os invasores enquanto é tempo. Se fosse eu a autoridade competente, independente das perdas eleitorais que a ação causaria, mandava a polícia por abaixo, a cacetete, qualquer início de obra irregular em local impróprio. É preciso ser enérgico para evitar tragédias como essa que acontece.

Isso sem falar, claro, na incapacidade latente das autoridades, que poderiam minorar, e muito, a situação se dispusessem de inteligência suficiente para avisar a população sobre as possíveis condições adversas do clima. Mas essa é outra história.

Pra não dizer que não falei de flores, o problema de Ribeirão é, há décadas que está sendo (mal) finalizado pela atual administração, irá minorar, mas não resolver o problema, o mesmo quando o assunto é enchentes. O plano de drenagem, feito pelo Gasparini e (mal) executado pela atual administração, ira minorar, mas não resolver, o problema. A coisa só vai começar a mudar quanto tiver um(a) chefe de Executivo com colhões para enfrentar a coisa de frente. E o primeiro passo é desocupar, sem choro nem vela, as áreas na Álvaro de Lima, na Vila Vírginia, e acabar com a vergonha chamada favela do Brejo, a meu ver os pontos mais críticos de enchentes na cidade.

Não que o povo que mora nessas áreas não tenha sua responsabilidade. Existia uma senhora que morava na Vila Virgínia que vivia perdendo tudo, há décadas, nas enchentes. Pelo menos uma vez por ano ela, que já era figurinha fácil na agenda de jornalistas, tinha estragos a mostrar. Se ela perdia tudo, todo ano, com as enchentes, uma coisa fica clara: ela não deveria (por vontade própria) morar naquele lugar. E a prefeitura, por obrigação, não deveria permitir que ela ali permanecesse.

Algumas atitudes são simples, mas acabam não sendo colocadas em prática para evitar problemas. O político enérgico, mais sério e preocupado com o bem das pessoas, têm o dever de impedir a ocupação irregular de áreas suscetíveis a enchentes e desmoronamentos. Para preservar votos, a imensa maioria fecha os olhos e deixa o pau moer. Curioso é que esses mesmos bastardos, que se escondem atrás da leniência torpe, são os mesmos que, em dias de chuva e tragédia, se apressam em colocar sua botinhas – no caso de Ribeirão, rosas – preparar seus discursos capengas e emocionados para recolher, via de regra, os corpos que eles mesmos ajudaram a plantar.

Na boa, estou cansado, profundamente cansado, dessa mediocridade de quem nada faz pra evitar os problemas e depois apressasse em dar condolências às vítimas que ajudou a criar.

Resumindo – acho que já escrevi até demais – em meus princípios estão profundamente arraigados dois conceitos que dificilmente conseguirei esquecer. O mais forte deles, que aprendi com o homem mais sábio que conheci, meu avô Zualdo, diz que somos responsáveis por tudo que nos acontece, de bom ou de mal. Se escolhemos construir nossa casa na encosta do morro e lá morar, temos que saber que, se ele cair, a responsabilidade maior pela morte de nossa família, quando tudo desabar, será nossa.

Por último e não menos importante, é preciso lembrar que aquele que escolheu a missão de administrar não pode se furtar às responsabilidades que assumiu, embora muitas vezes sejam elas um fardo. A leniência é o primeiro passo para a tragédia. Assumir responsabilidades não é só prantear os mortos, mas sim impedir, às vezes contra a própria vontade delas, que as pessoas tomem atitudes idiotas, que colocarão sua própria existência em risco.